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Opinião
Ricardo Andrade – Comissário de Bordo
Ricardo Andrade
Comissário de Bordo

#vamostodosficarbem

O mais importante!!

5 de abril de 2020
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Desde dezembro escrevi, neste espaço, sobre vários temas. Desde dezembro gastei inúmeras linhas no que julgava serem assuntos importantes. Desde dezembro falei sobre vários desafios que julgava serem enormes.

Mas enquanto escrevia no conforto de várias certezas, a maior das lutas já se travava sem que eu e milhões tivéssemos noção. Enquanto o sol se punha todos os dias da mesma maneira, a vida estava a mudar de uma forma que jamais poderíamos esperar. Enquanto continuávamos a viver na lufa-lufa habitual, tudo começava a parar sem que soubéssemos ou compreendêssemos o que estava para vir.

À medida que os meses e estas crónicas se sucediam, espreitava cada vez mais perto uma alteração como não havia memória. A ameaça ficava cada vez mais próxima sem que entendêssemos a sua dimensão. As nossas rotinas mantinham-se sem sabermos o quão duro iria ser o despertar para uma cruel realidade da qual não conseguiríamos fugir. E de repente, depois de ignorarmos todos os sinais, depois de assobiarmos para o lado, depois de enterrarmos a cabeça na areia, veio finalmente bater-nos à porta a dura verdade. Dia após dia, tudo piorava.

As soluções que o pareciam ser, nada mais eram que meras ilusões. As previsões animadoras esbarravam na constatação de que não havia golpes de mágica que nos tirassem do caminho tortuoso definido por um inimigo silencioso. E assim continuamos, a tentar lutar contra algo imprevisível, a procurar raios de sol nesta noite escura, a alimentar esperanças de vislumbrar luz no meio de nuvens sombrias.

Por aqui, de onde vos escrevo, deito-me a pensar no que virá amanhã. Descanso a cabeça desconhecendo os números que surgirão por volta da próxima hora do almoço. Repouso o corpo esperando que ele ganhe cada vez mais força para segurar nos meus filhos tentando que não me falhe um abraço que faça com que eles se apercebam da tragédia que assola o mundo deles.

Este é o momento em que todas as diferenças de opinião valem zero. Este é o tempo em que, sem podermos dar as mãos, temos que caminhar juntos. Esta é a altura de unir como jamais o fizemos. Sim, estamos a lutar pelas nossas vidas. Sim, estamos a lutar pela nossa sobrevivência. Sim, estamos verdadeiramente a lutar não pelo nosso futuro mas para que haja um futuro.

Escutava, no outro dia, acerca de como seria a vida depois desta provação. Penso muitas vezes se ela existirá depois de tudo isto. Diz-me a razão que é normal, que sinta tristeza. “Não podemos desanimar!”, informa-me um pivot do telejornal. “Vai ficar tudo bem!” , leio no cartaz que o meu filho pintou com um arco-íris e que decora a janela de uma divisão da nossa casa. E tudo isso me dá força para não desistir. Para fazer os meus filhos ficarem felizes mesmo sem saírem de casa.

Para estar lá para os meus pais sem poder deixar o toque de um beijo falar por mim. Porque, no final do dia, o que importa é mesmo estarmos cá para contar a história e podermos voltar a sentir o toque de uma mão, a força de um abraço e o calor humano sem termos medo de que possam fazer mal aos que amamos.

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