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Entrevistas

Rui Baptista o arquiteto e os aeroportos

«ALGO ICÓNICO QUE PUDESSE FAZER UMA DIFERENÇA POSITIVA»

5 de março de 2016
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Pessoal

A arquitectura sempre foi uma paixão. Sentiu que em Portugal não iria ter as oportunidades desejadas?

Nos Anos 90 a Arquitectura teve um ‘’boom’’ enorme, onde uma média de 1500 profissionais saíam qualificados das universi¬dades anualmente.

Um valor impossível para o mer¬cado absorver e permitir opor-tunidades de qualidade num País com a dimensão do nosso Portugal, logo, foi natural a minha saída para Inglaterra assim que terminei os estudos, em 1998.

Hoje é um arquitecto reconhe¬cido internacionalmente. Há um sentimento de dever cumprido?

Estou bastante feliz pela carrei¬ra até aqui e muito orgulhoso dos vários projectos icónicos que pertencem ao meu passado pro-fissional, tendo-me especializado em projectos de grande escala dentro das áreas de aviação, estádios, escritórios e ensino.

Contudo, é a aviação e o dese¬nho de aeroportos que me permi¬te uma satisfação pessoal muito única.

Pela complexidade dos projec¬tos, pelos quais me especializei há mais de 10 anos e com um sentimento de que já adquiri bas¬tantes experiências, que adoro partilhar com muitos profissionais que sintam fascínio por este tipo de edifícios, onde felizmente o meu trabalho e entrega tem sido positivamente reconhecido em todos os cantos do Mundo.

Mas com muito ainda por cumprir com o intuito de continuar a fazer diferenças positivas...

A nível pessoal sempre foi uma pessoa de emoções, onde os amigos ocupavam e ocupam um lugar especial. Custou-lhe sair do País?

Sem dúvida. Mas uma decisão muito acertada. As emoções continuam sempre a ser senti¬das com a maioria dos amigos, sempre presentes em todas a minhas visitas ao País, assim como visitas constantes dos ami¬gos a todos os países onde vivi. Enorme cumplicidade dentro de um grupo único de amigos que considero como família.

Já viveu e visitou dezenas de países. Do que teve oportuni-dade de experienciar qual foi o local que mais o impressionou pela positiva e pela negativa?

Em modo positivo destacaria a beleza do Mar Vermelho, onde fiz o meu primeiro mergulho. Assim como a cidade de Petra na Jordânia, ou a cidade de Siem Reap no Cambodia, ou os gla¬ciares no Alasca. A exótica praia deserta na Jamaica, assim como os templos Maias em Tulum no Mexico, a floresta na Costa Rica com os seus coloridos papagaios, o Serengeti no Quénia, a cidade de Palmira na Síria, a cidade de Choirokoitia no Chipre, com mais de 8000 anos, a água cristalina nas Bahamas, o oásis em Sebha na Líbia, sem esquecer a Lagoa das Sete Cidades nos Açores.

Em modo menos positivo, algo que me trouxe muitas imagens menos boas, foi a quantiadde de pobreza e bairros pobres nos vários países que visitei. Destaco com mais incidência uma área do Cairo, que me surpreendeu pela dimensão e que não é divulgada para o exterior, afectando perto de cinco milhões de pessoas.

Portugal, no meios destas vivências, fica em que patamar?

Primeiro. E ainda com tanto para visitar cá dentro... Tanta beleza única natural, cultural e histórica.

Regressar faz parte do seu pro¬jecto de vida, após quase 20 anos fora do País?

Sim! Sem dúvida que faz parte dos planos.

Além da arquitectura, a fotografia sempre foi uma paixão. Em que estado está?

Confesso que não tem a prepon¬derância e importância de outro¬ra, mas como paixão mantém-se. Acompanha-me em todas as viagens e em alguns momentos pessoais, que aproveito para reflectir e transponho para ima¬gem fotográfica.

Portela

Quantos anos morou na Portela?

Vivi dos 3 anos até aos 24, logo 21 anos ao todo.

Que recordações ainda guarda?

Recordações de um crescimento tão privilegiado como feliz, envol¬to de muita segurança, amizade e valores morais. Num local que me permitiu um crescimento tão forte como equilibrado, onde as memórias positivas preenchem a grande maioria de toda a minha infância e adolescência.

Do ponto de vista arquitectónico, como descreve a Portela e Moscavide? E o que é que poderia trazer maior qualidade de vida a estas duas localidades?

Bairros muito distintos. A Portela, embora nao sendo um ícone estético, tem um carácter muito característico e muito patente no ar que se respira. A Portela res¬pira saúde e transpira equilíbrio. É um importante polo de união, que lhe confere uma identidade muito única e orgulha todos os ‘’Portelenses’’.

Moscavide tem uma escala mais urbana. Com uma vida diária muito patente nas ruas principais e um aglomerado de gerações que partilham vivências nos pas¬seios, assim como nos vários locais desportivos, que permitem contactos semanais e alimentam a mística do bairro.

Desporto

Praticou futebol e futsal, sempre como guarda-redes. Qual destas duas modalidades mais o encanta?

Como guarda-redes tive expe¬riências muito distintas que me cativaram, em ambas as modalidades. No futebol desenvolvi muito a capacidade de liderança da área que era responsável, assim como o posicionamento para cobrir, do melhor modo, a baliza de 2,44 metros de altura e 7,32 metros de largura. Permitiu também explorar a capacidade de transcender os limites físicos do corpo, que muitas defesas assim o exigiram.

No futsal o ritmo intenso da modalidade requer um nível tác¬tico elevadíssimo, aliado a refle¬xos e instinto muito grandes, como requisitos específicos.

Recomendo ambas!

Além do Benfica, passou por dois clubes do concelho de Loures, Olivais e Moscavide e Sacavenense no futebol e AM Portela no futsal. Qual é que o marcou mais?

Depende do escalão, pois tive experiências únicas em todos, como ser campeão distrital aos 13 anos pelo Sacavenense, de parti¬cipar nos campeonatos nacionais pelo Olivais e Moscavide e jogar contra figuras como o Figo, Rui Costa, Paulo Torres, Brassard, entre muitos outros. Por fim a AM Portela, com uma equipa totalmente amadora e com valo¬res somente nascidos na Portela, mas com muito amor à camisola e dedicação, a equipa que no auge da história dos seniores foi apurada para a fase final da modalidade, que até então elegia as seis melhores equipas a nível nacional.

Continua a seguir os desempenhos destes clubes?

Sim. Sempre. Em especial gosta¬ria de enviar enormes parabéns a ex-colegas que jogaram comigo na AM Portela e que agora, com muita qualidade, desempenham funções técnicas, a elevarem o perfil da equipa e a manterem os lugares cimeiros. O mesmo se aplica no Sacavense e Olivais e Moscavide, onde vários treinado¬res actuais foram jogadores que cresceram comigo. Óptimo regis¬to e muito saboroso de acompa¬nhar.

Profissional

Na sua profissão teve várias ligações ao desporto, mais especificamente ao fute¬bol. Como foi idealizar está¬dios como os do Arsenal, do Benfica e de Faro-Loulé?

Responsabilidades diferentes em cada projecto, com preponderân¬cia no Estádio da Luz, onde tam¬bém tive oportunidade de con¬tribuir esteticamente durante os nove meses que acompanhei a obra, representando uma empre¬sa inglesa (na altura HOK Sports, que agora é Populous). Foram meses muito intensos, entre 2002 e 2003, com muita paixão e repletos de experiências únicas, que estão muito bem guardadas em mim e as quais tenho muito orgulho de partilhar.

Dos seis aeroportos em que já desempenhou tarefas, qual o que o deixou mais satisfeito?

Diria o Aeroporto Internacional de Larnaca, no Chipre, que acompa-nhei desde o primeiro dia de projecto, atá à festa de inauguração. Liderei uma equipa que chegou a ter 32 elementos e exigiu a minha contribuição, pela primeira vez, em todos os aspectos de dese¬nho e obra como coordenador total do projecto com 100.000m2. Funções iguais às que tenho agora, mas por ter sido o primeiro ‘’bebé’’ a tempo inteiro, tem um lugar especial nas memórias.

Caso Lisboa avance com um novo aeroporto, gostaria de liderar a equipa que o desenhasse?

Sim. Desde 2007 que estou em contacto com as equipas de dese¬nho e operadores. Estive nessa altura uma semana em Portugal, especificamente por iniciativa pró¬pria, a reunir com as várias equi-pas. Sabem quem eu sou e que, assim que algo ganhe forma, o prazer seria muito em contribuir para o desenvolvimento do meu País, com experiência acumulada em vários campos do Mundo.

O novo aeroporto de Istambul é de uma enorme grandeza. Justifica-se?

É o maior edificio em constru¬ção do Mundo com 1.300.000m2 (um milhão e trezentos mil metros quadrados). Vai ao encontro das necessidades de Istambul em aumentar a capacidade do esgotado aeroporto existente (Attaturk) e também o objectivo da companhia de aviação local (Turkish Airlines), assim como as de operadores e investidores, de dominarem as rotas de ligação entre a Europa e Ásia, fazendo directa competição às compa¬nhias de Abu Dhabi (Etihad) e Dubai (Emirates). Um país que quer colocar de modo muito próprio a sua impressão digital na história da aviação. Em relação à questão da necessidade de algo desta escala ou não, prefiro focar-me nas minhas responsabilidades que são desenhar e entregar.

Turquia

Istambul é uma boa cidade para se viver?

É uma cidade fabulosa, com cerca de 15 milhões de habitan¬tes. Com o Estreito do Bósforo muito patente e um ritmo de vida muito atractivo. Uma temperatura muito parecida com Portugal e uma Cultura, que embora maiori¬tariamente muçulmana, está niti¬damente virada para a Europa, o que torna a integração e a vivência com a cidade ainda mais interessantes. Envolta de muitas referências históricas com varia¬díssimos exemplos arquitectóni¬cos de eleição com vários sécu¬los. Também se recomendam os banhos turcos e a famosa gas¬tronomia.

Como tem sido viver na Turquia, perante os atentados recentes?

É uma realidade muito triste que afecta sempre e traz reflexão. Infelizmente também o vivi em Londres, nas atrocidades do aten-tado de 7 de Julho de 2005, mas temos de ter a capacidade de olhar em frente e deixar o destino decidir.

Dada a sua vivência, a Turquia, culturalmente, aproxima-se mais da Europa ou da Ásia?

Istambul é muito parecido com a Europa, mas todo o resto do país está muito mais referenciado com a Ásia.

Os refugiados continuam a ser um tema central na Europa, apesar de menos noticiados. Como tem reagido a Turquia a essa questão?

Existe um campo de refugiados sírios, que está estabelecido pró¬ximo da fronteira com a Síria, na parte Este do país. Dado o alongar dos anos, já tem a sua vida própria. De qualquer modo, os conflitos nessa região man¬têm-se.

Loures

Como define o nosso Concelho?

Um Concelho em constante evo¬lução e que oferece condições satisfatórias aos seus habitantes.

Sente que Loures tem mais van¬tagens em ser mais um satélite de Lisboa ou tem condições para se afirmar por si próprio?

Sinto que nestas condições beneficia um pouco dos dois. Consegue ter a sua identidade e, ao mesmo tempo, usufruir da ligação geográfica a Lisboa.

Tem o desejo de construir obra no nosso Município?

Sim, com algo icónico que pudes¬se fazer uma diferença positiva para a vida e referência dos habi¬tantes do Concelho.

Pedro Santos Pereira

 

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