Ninho de Cucos
John Grant - The Art Of The Lie
8 de julho de 2024
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John Grant, nascido em 1968 no estado do Michigan, é um músico, compositor conhecido pela sua voz de barítono e uma escrita densa e emotiva.
Após algum destaque como membro da banda The Czars, iniciou uma carreira a solo aclamada pela crítica. O álbum de estreia, "Queen of Denmark" é uma feliz mistura de pop, rock e elementos eletrónicos. Grant é ainda reconhecido pela sua honestidade absoluta nas letras, abordando temas como o amor, a identidade e a luta contra a adversidade.
John Grant nasceu no seio de uma família conservadora metodista mas não tem pejo em se assumir gay ou a revelar num concerto em Inglaterra que contraiu HIV.
Lançado a 14 de junho, o sexto álbum de originais “The Art of the Lie” começou a ser pensado no outono de 2022, já depois de John Grant ter sido apresentado a Ivor Guest, produtor e compositor, por exemplo, de Grace Jones.
Um ano e meio depois, o resultado é o álbum mais encorpado, cinematográfico e exuberante de John Grant até à data.
“The Art of The Lie” é de um realismo lírico tão sombrio quanto a sua produção é épica e ousada. Ivor Guest e o seu elenco de músicos conceituados trouxeram drama e nuances inesperadas ao jeito de Laurie Anderson ou The Art of Noise. Grant compara os sabores musicais de “The Art of The Lie” à banda sonora majestosa de Vangelis para Blade Runner,“…A primeira vez que vi a cena de abertura do filme e ouvi aquela música, fiquei espantado por estarmos a ser apresentados ao império do mal do futuro em combinação com os sons mais bonitos que já tinha ouvido…”, confessa.
A parentalidade é outra presença constante em “The Art of the Lie” . Três músicas, “Father”, segundo Grant uma das melhores que já escreveu, ”Mother and Son” e “Daddy” que explode de um verso mordaz para um refrão colorido, compõem a espinha dorsal do álbum. “…Father contém a visão adulta e a de criança. Daddy é a perspetiva da criança. Nelas falo sobre a forma como me relaciono com os homens ao sair para o mundo, por causa da confusão em que fui criado sobre o que significa ser homem…”
John Grant ousa pisar os territórios do funk no tema de abertura “All That School For Nothing”, vocalização carregada de efeito vocoder, algo que se repete durante o álbum e a dança, tal como a ironia, continuam no primeiro single, “It’s a Bitch”. Ousa ainda na duração de 5 dos temas que compõem o álbum, a rondar os 7 minutos cada. Mas em cada risco e ousadia acaba por ganhar pontos e oferecer-nos um muito bom trabalho do primeiro semestre.
Enquanto gravava “The Art of the Lie”, John Grant usou as referências de discos dos Talk Talk, Kate Bush ou Cocteau Twins e o espírito de humor dos Devo. Tal por si só não determina a qualidade de um disco mas se calhar também ajuda.
Sendo inegavelmente um disco de John Grant, mesclando humor com tragédia, raiva e compaixão, há uma ambição musical e coragem em “The Art of The Lie” que compensa os seus momentos mais políticos e pessoais.
A inesperada ligação entre beleza e crueldade torna a audição do sexto álbum de Grant cativante, um disco que liga traumas de infância a reflexões adultas duras e sofridas que desembocam no mal-estar político dos EUA de 2024, “…um país atraído para o precipício de sua própria destruição!”, exclama John Grant.