Opinião de Joana Leitão
As touradas do costume
10 de março de 2020
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João Moura, cavaleiro tauromáquico e criador de galgos, foi detido no passado mês de fevereiro por suspeita de maus-tratos a animais. Foram apreendidos e recolocados em associações locais 18 galgos, com sinais severos de desidratação e subnutrição.
De salientar, que os maus-tratos a animais punidos criminalmente não envolvem, apenas, ações, tais como agredir fisicamente um cão.
Envolvem, também, omissões, de entre elas, a falta de alimentação ou água, de cuidados veterinários, de condições de higiene ou de outros que se revelem necessários ao bem-estar dos animais. O estado deplorável em que se encontraram os animais fez adivinhar longos períodos de privação, pelo que de estranhar não foi que um deles não tivesse sobrevivido ao resgate. Neste caso, a pena aplicável duplica por ter resultado em morte, cujo limite é de dois anos de prisão ou 240 dias de multa.
Curiosas são as afirmações do arguido que, indignado, referiu que nunca tinha maltratado animais. Na verdade, esquartejar e encurralar touros, escudar-se em cima de um cavalo exigindo dele a bravura que atribui a si próprio, ter máquinas de produção de cães para venda e criar galgos para corridas são atos de quem estima os animais.
E quando se faz disto vida, deixá-los morrer por inanição deixa de parecer absurdo quando comparado com tudo o que já se fez. Será que se pensa mesmo que o touro está mortinho por ser toureado, que o cavalo se regozija com o convívio na arena, que as cadelas gostam de ser fecundadas e separadas das crias vezes sem conta e que os galgos só gostam de ser utilizados em corridas ou só se finge que se pensa?
É possível que gostar de animais esteja nos antípodas de casos como este e, infelizmente, há muitos por todo o país. Se 18 galgos estão a salvo, em instituições que precisam da ajuda de todos, no local mantêm-se outros cães, cavalos e vacas, aparentemente em condições semelhantes.
Espera-se uma sentença justa, que clarifique a desconformidade das omissões, acompanhada de uma pena acessória que iniba a detenção de animais de companhia e, consequentemente, a sua reprodução.
Que ajude, por um tempo, a repensar. E que dê a conhecer os efeitos da dessensibilização de pessoas. Um perigo que não atinge só as outras espécies.