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João Pedro Domingues – Professor
João Pedro Domingues
Professor

Opinião de João Pedro Domingues

Será ainda possível?

5 de novembro de 2023
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No final do mês de setembro, fui ao cinema ver o filme Golda, com uma atriz que muito aprecio, e que aborda uma temática que me interessa.
O filme retrata de forma particular os acontecimentos do dia 6 de outubro de 1973, Dia do Perdão, o Yom Kippur, em que forças combinadas do Egito, Síria e Jordânia, atacaram de surpresa a Península do Sinai e os Montes Golã.
E durante os 14 dias seguintes, Golda Meir, a primeiro-ministro de Israel, foi confrontada com a possibilidade de uma catástrofe, que poria em risco a sobrevivência de Israel enquanto país.
50 anos depois, aconteceu episódio idêntico. Algo impensável para todos, dado Israel ter um sistema de inteligência dos mais sofisticados do mundo, um serviço secreto por todos reconhecido e um sistema de vigilância em torno da Faixa de Gaza, que afinal não funcionou.
Este ataque, para além do simbolismo da data, ocorreu num dos momentos mais delicados da história de Israel, numa altura em que apresenta grandes divisões internas e de contestação a Netanyahu, que tentou alterar significativamente o poder judiciário, tendo levado a grandes manifestações por todo o país.
O grupo terrorista Hamas entrou fronteira dentro, matou, decapitou, violou e sequestrou os que foi encontrando no seu caminho. Mais de 200 pessoas, jovens na sua grande maioria, foram perseguidas e mortas no festival de música em que participavam. As imagens foram chocantes. A vida humana, para aquele grupo terrorista nada representa.
Israel ripostou, como qualquer país que tivesse sofrido um ataque tão hediondo teria respondido. Atacou, bombardeando, posições onde supostamente se localizavam bases do Hamas. E, por isso, morreram muitos civis, muitos inocentes, dado o Hamas utilizar edifícios como escolas, hospitais e outros, como bases de apoio, e utilizar a população, nomeadamente os reféns, como escudos humanos.
Vários países criticaram e criticam a desproporcionalidade da resposta. Mas como seria possível a defesa, quando o Hamas se esconde no meio da população, vive em tuneis e está fortemente armado, com o alto patrocínio do Irão?
Tudo isto ocorreu quando se preparava uma aproximação entre Israel e a Arábia Saudita, o Sudão e Marrocos. Este poderia ter sido o início de uma tentativa de normalização da relação entre Israel e outros Estados árabes, e o estabelecimento de uma plataforma que trouxesse a paz e a sã convivência entre Israel e Palestinos, entre o judaísmo e o islamismo.
Para o Hamas, esta situação não lhe seria favorável. Conhecendo, como bem conhecem, os israelitas, sabiam que um ataque como o perpetrado obrigaria a um contra-ataque violento sobre a Faixa de Gaza, como se veio a verificar. E também sabiam que, quanto maior fosse o ressentimento da população, maior seria a revolta dos palestinianos. E, possivelmente, as relações com os Estados árabes que estavam prestes a estreitar-se, não se concretizariam no imediato, o que realmente veio a verificar-se.
Puro calculismo do Hamas, que não se preocupou com a população, que bem saberia, iria sofrer as consequências do seu ato.
Mas todos concordamos que Israel tem de medir bem a sua atuação, para não se confundir com as ações do Hamas. Israel tem de ter uma ação mais contida, não abdicando da sua defesa, nem de tentar resgatar os reféns, mas não bombardeando e matando Palestinianos indefesos.
É fundamental anular e aniquilar esta força de índole terrorista, para que se possa dialogar e encontrar o caminho da paz. O Hamas não representa todos os palestinianos.
Se não houver uma intervenção urgente por parte da ONU, envolvendo todos os atores possíveis no terreno, esta guerra poderá tornar-se regional, com impactos não possíveis de prever por todos nós. Espero que ninguém esteja interessado nesse cenário.
É imperioso relançar, de imediato, o processo de paz. É fundamental encontrar, com a intervenção de todos, uma solução negociada de dois Estados, com base na resolução de 1967: dois Estados soberanos e democráticos, vivendo lado a lado em paz e segurança.
Será isto ainda possível?

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