Ninho de Cucos
Nick Cave
1 de outubro de 2016
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Skeleton tree
Nick Cave, nascido na Austrália há 59 anos, chegou no mês passado à edição do seu 16o trabalho de originais entre muitos outros trabalhos, participações e colaborações desenvolvidas ao longo de mais de 30 anos de trabalho a solo e após o início de carreira numa experiência gótica arty com os Birthday Party. Com uma superbanda post-punk formada por Mick Harvey, guitarrista dos Birthday Party, aqui na bateria, Barry Adamson, baixista dos Magazine e Blixa Bargeld, guitarrista dos Einsturzende Neubaten, se iniciaram Bad Seeds. Nick Cave and the Bad Seeds.
Mais que nunca, e assim continuará ao longo da carreira, Nick Cave explora os temas da violência, morte, amor, América e religião, que ilustram uma amálgama sonora constituída pelos fragmentos post punk mais artístico, rock, blues e gospel, apoiados na sua voz de barítono à Leonard Cohen, mas com arranjos bem mais cinzentos e obscuros. Os muitos álbuns, que se seguem nesta longa carreira, de Nick Cave são a afirmação de estarmos perante um dos mais importantes artistas de sempre do rock alternativo, de personalidade vincada, obcecado pelo amor, morte e experimentalismo q.b., que o afasta de outros autores contemporâneos.
Cronologicamente aludindo ao trabalho de Cave, obras como “From her to eternity”, “Your funeral...my trial”, “Tender prey”, “Henry’s dream”, “Let love in”, “The boatman’s cal” ou “No more shall we part”, para não falar do maior sucesso comercial, “Murder ballads”, são primas na sua marca histórica da música popular do século XX, na qual se situam estes discos, que correspondem a metade do tempo a que Nick Cave está no ativo. Na última década para além da continuação de edição discográfica de Nick Cave, o artista com o entretanto todo-poderoso da composição dos Seeds, Warren Ellis, forma os Grinderman, escreve argumentos e bandas sonoras para cinema.
Com Nick Cave nem tudo são rosas. É conhecido como o terror dos jornalistas, tendo já per- petrado diversas tentativas de agressão. Alguns dos seus concertos no virar do séc. XXI eram, não muito mais que, entediantes e relação com managers e agentes do meio musical sempre longe de pacífica. A tragédia ocorrida com Arthur no ano passado, em ver- são acidental, supera e apaga, talvez, resquícios de uma vida passada por Nick lá para os lados de Portobello Road em Londres, nos anos 90. A morte do seu filho ocorre duran- te as gravações de “Skeleton tree”, o último álbum de originais de Nick Cave and the Bad Seeds e desta vez lidar com a morte, a dor, a religião e a amargura transformam-se numa experiência cruelmente real, mas com a qual o autor se confronta com maturidade, mesmo quando as suas letras são tão diretas como no tema de abertura “Jesus Alone”, "...You fell from the sky/ Crash landed in a field,..".
O tema “I need you” é, provavel- mente, aquele em que mais perto de chorar alguma vez esteve a voz de Nick Cave. “Rings of Saturn” e o tema títu- lo “Skeleton tree” são outros dois extraordinários temas num álbum com 40 minutos que pas- sam depressa e que, apesar de depressivo e angustiante, é belo, denso mas não excessivamente orquestrado. Superior e sinérgico o resultado do binómio Nick Cave / Warren Ellis (letrista e compositor). Recheado de sentimento e emo- ção, sem passar a barreira do histrionismo, “Skeleton tree” é um disco obrigatório, quem sabe para os dias de Outono/Inverno que se adivinham e apesar das muitas visitas já efetuadas a Portugal, este merece atuação dedicada.