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Joana Leitão – Jurista
Joana Leitão
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Opinião de Joana Leitão

“Tenho aqui à minha frente um doente a ganir”

5 de dezembro de 2020
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Escrevi sobre José há algum tempo, a propósito das consequências do tabaco na saúde. Um ano e meio depois e já com 42 anos, continua a lutar contra um cancro do pulmão, embora os últimos dias pareçam indicar que a sua luta está prestes a chegar ao fim.

Muita coisa mudou nestes últimos dois anos, desde que soube a notícia. Apesar de ter vivido mais de 12 meses com alguma normalidade, os últimos tempos têm trazido reais desafios. Quase perdeu a voz, teve que colocar uma prótese interna para se conseguir alimentar e, recentemente, deixou de andar.

Idas ao hospital e internamentos perdeu-lhes a conta, mas há um mês e meio viveu um episódio que o marcou particularmente. Transportado de um hospital local com menos recursos até um dos maiores hospitais, se não o maior, de Lisboa, deu entrada nas urgências. Ao seu lado, ouviu dizer um médico com cerca de 30 anos: “Não sei o que fazer, tenho aqui à minha frente um doente a ganir”. Depois disto, foram 30 longos minutos, entre convulsões, dores extremas e lágrimas de alguém que começava a perder a locomoção, e a decisão, que já constava do seu processo, de administração de morfina.
Aquela afirmação tinha-o deixado desorientado. E ofendido. Teria o médico confundido a sua área de especialidade? E, assumido que um paciente debilitado fisicamente mas plenamente consciente, não ouve e não sente?

Situações como esta relembram o quanto a medicina se circunscreve tantas vezes ao enquadramento de certos sintomas físicos em determinados diagnósticos visíveis e à aplicação de tratamentos, na sua maioria protocolados, que isolam o corpo da mente e das circunstâncias.

É sabido que uma relação empática e de confiança entre médico e paciente traz resultados mais promissores, mas o curso de medicina não abrange estas ferramentas. E os futuros médicos ou têm competências relacionais, ou as desenvolvem por si, ou simplesmente não as adquirem.

Apesar de existirem progressos neste campo e, numa altura em que tantos profissionais de saúde, incluindo médicos, têm dado provas de excelência, situações como esta continuam a acontecer. E neste caso, talvez o médico ainda possa aprender a relacionar-se.

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