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Opinião
Florbela Estevão – Arqueóloga e Museóloga
Florbela Estevão
Arqueóloga e Museóloga

Paisagens e Patrimónios

Dia Internacional dos Monumentos

7 de abril de 2025
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Mais uma vez celebra-se, no dia 18 de abril, o Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, este ano com enfoque no tema o Património resiliente face às catástrofes e conflitos. Esta efeméride é promovida pelo Internacional Council on Monumentens and Sites (ICOMOS), organização não-governamental mundial associada à UNESCO. O Conselho Internacional dos Monumentos e Sítios é a única organização deste género que se dedica a promover a teoria, a metodologia e a tecnologia aplicada à conservação, proteção e valorização dos monumentos, conjuntos e sítios.
Na realidade, há muito que este dia é celebrado ao nível mundial, o mesmo acontecendo em Portugal, onde o organismo da tutela - o Património Cultural, I.P.- assume um papel de coordenação nacional, como entidade responsável. Para os interessados existe um menu no site deste organismo, onde todas as atividades desenvolvidas pelas mais diversas instituições são divulgadas, sugerimos a sua consulta: https://www.patrimoniocultural.gov.pt/agenda/ Também, a Rede de Museus de Loures, oferece um programa especifico que poderá consultar em: https://www.cm-loures.pt/Conteudo.aspx?DisplayId=16535
Considerando o património cultural classificado no nosso concelho selecionei as Linhas de Torres Vedras, precisamente por serem um sistema defensivo edificado maioritariamente em 1810, para defender a cidade de Lisboa e o seu importante porto comercial da 3ª Invasão Francesa, comandada pelo general Masséna, oficial em quem o Napoleão depositava grande confiança. Esse período da história, o inicio do seculo XIX, foi particularmente difícil para os portugueses. A construção do sistema implicou um grande esforço da população civil, que sob orientação dos engenheiros militares, abandonaram os seus afazeres quotidianos e foram requisitados para trabalhar no alto das serras, participando na construção de mais de 150 fortificações militares de campo.
Todavia, o esforço da população não se resumiu à sua colaboração nas Linhas de Torres, ela também foi essencial para a manutenção do exército anglo-luso, fornecendo alimentos, animais para abate e transporte, habitações para os “abalotamentos” de militares, ou seja, o aquartelamento de soldados em casas particulares. Mas, sem dúvida um dos impactos sociais e económicos mais consideráveis terá sido a devastação provocada pela passagem dos exércitos, pela pilhagem e violência sobre as populações e a fuga de milhares de pessoas que vieram para a região de Lisboa, principalmente após a aplicação da política da “Terra Queimada”.
Ora, o sistema defensivo conhecido como Linhas de Torres (atualmente integrado num projeto turístico e cultural designado por Rota Histórica das Linhas de Torres: https://www.rhlt.pt/pt/ ), é, sem dúvida, um património histórico, arquitetónico e militar que remete o visitante para um período da história nacional e internacional, onde os conflitos provocaram danos consideráveis, numa conjuntura que implicou uma nova definição da geopolítica internacional.
Mas, as Linhas de Torres devem ser, por sua vez, integradas num contexto mais alargado, nomeadamente a todo um sistema de apoio que fora das fortificações procurava dar resposta às necessidades. Por exemplo, em Sacavém, portanto, na retaguarda das Linhas de Torres, foi montado um Hospital Militar temporário. Para tal uma fábrica de estamparia terá sido desativada para nela se instalar o dito hospital, assunto que abordarei na próxima crónica. Esse hospital militar recebia os soldados feridos em batalha, mas a presença deste equipamento implicou, por sua vez, a necessidade de se fazer um novo cemitério.
Consultando a correspondência de António Firmo Felner no Arquivo Histórico Militar, nomeadamente um documento datado de 11 de novembro de 1810, este solicita autorização para realizar a compra de um terreno para o cemitério: “(…) Em consequência do Reverendo Prior do Lugar de Sacavem, me aviza, que no Semiterio da dita sua Parrochia, não tinha Sepultura em que se pode-se enterrar os Soldasos que fallecessem no Hospital Militar, que ali se acha(…)”, para reforçar esta necessidade o Reverendo Domingos Francisco Gonçalves, em 29 de outubro do mesmo ano afirma o seguinte: “A necessidade de Semiterio he ûrgentissima, porque todas as Sepulturas da Igreja velha que Servia de Semiterio, Se achão cheas, não só dos Soldados que falecerão, mas também dos muitos daquelez infelices que fugiram perciptidamente ao Inimigo vierão vencidos da fadiga da Saude e da mizeria acabar aqui o ultimo Suspiro.” Foram então tomadas todas as diligências para encontrar um terreno adequado a esta função, uma vez que a igreja já não podia receber mais corpos. De notar que o conflito implicou, em Sacavém, um aumento da mortalidade, tendo a paróquia que dar resposta aos seus paroquianos, mas igualmente aos soldados mortos no hospital e a muitos dos refugiados de guerra que fugiram para o interior das Linhas de Torres.

(Continua na próxima crónica)

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