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Opinião
Florbela Estevão – Arqueóloga e Museóloga
Florbela Estevão
Arqueóloga e Museóloga

Paisagens e Patrimónios

A Casa-Museu José Pedro em Sacavém

5 de fevereiro de 2019
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Para aqueles que apreciam a visita a casas-museu, onde ainda muitas vezes “respira” algo da vivência dos seus antigos habitantes, sugiro a visita a este espaço museológico do nosso concelho, que permite conhecer o percurso artístico de um homem que viveu a maior parte da sua vida nesta cidade de Sacavém, e trabalhou vários anos na sua célebre Fábrica de Loiça.

José da Silva Pedro nasceu nos inícios do século XX, a 7 de fevereiro de 1907, na povoação de A-dos-Pretos, freguesia de Maceira, concelho de Leiria, numa família modesta. Aí viveu até aos 21 anos de idade, tendo ficado órfão de pai aos três anos. Veio para Lisboa cumprir o Serviço Militar em 1928, no Regimento de Sapadores dos Caminhos-de-Ferro em Campo de Ourique, onde chamou a atenção dos seus colegas e superiores pela qualidade dos desenhos que já então realizava. Após uma breve experiência no Curso Especial de Escultura da Escola de Belas-Artes, foi obrigado a abandonar os estudos e a garantir o seu sustento como 1º modelador na Fábrica de Loiça de Sacavém.

Na cidade de Lisboa conheceu Evangelina Martinez, emigrante da Galiza, com quem casou em 1935, e de quem teve dois filhos (Fernando Carlos Martinez da Silva e Orlando Emílio Martinez da Silva). Ao longo da sua vida participou em várias exposições e concursos, tendo sido alvo de notícias em diversos jornais. Morreu em 1981, após uma vida de intenso trabalho, caracterizada pela persistência, valor hoje cada vez mais raro, e por um sonho: deixar um museu dedicado às suas obras.

José Pedro, logo na sua infância, manifestara uma grande aptidão para o desenho e para a modelação de vários objetos em barro, nos quais revelava o seu imaginário infantil. Dessa fase precoce é de destacar a réplica que fez da igreja da sua terra, elaborada aos 7 anos de idade, reprodução de tal tamanho que possibilitava a entrada a oito pessoas, facto espantoso, por ser obra de uma criança, o que causou, naturalmente, grande entusiasmo e admiração por parte dos seus conterrâneos.

Contudo, devido às suas circunstâncias familiares, e como disse, desde cedo teve de trabalhar para ajudar a mãe, tendo passado por várias profissões que não se cruzavam com os seus principais interesses e aptidões, que eram o desenho e a escultura (moldagem de figuras e outros objetos em barro). Assim, foi pedreiro, rachador de lenha, servente e operário numa fábrica de cimento. Todavia, apesar de viver num contexto adverso, manteve persistentemente o hábito de moldar (essencialmente o barro) sempre que lhe era possível, trabalhando de dia e reservando a noite para essas suas criações artísticas.

Foi durante o período do serviço militar que aprendeu a ler e a escrever, uma vez que na infância não conseguiu terminar os seus estudos, como se disse. Um dos seus objetivos nesta altura da sua vida era o de frequentar o tal Curso de Escultura da Escola de Belas-Artes, no que foi incentivado por Raúl Esteves, comandante do seu regimento, que o recomendou ao pintor Sousa Lopes e ao crítico de arte Luís Keil. Foi assim que conseguiu ingressar naquela instituição de ensino, a título particular, uma vez que possuía poucas habilitações. Mas, a sua experiência aí foi infelizmente curta, pois, para além de doença que o acometeu, teve sobretudo a necessidade de assegurar o seu sustento e de procurar trabalho, como referido. Apesar de tudo, a breve passagem por aquela instituição artística permitiu-lhe conhecer figuras importantes do mundo restrito dos que, na época, produziam obras de arte plástica. Com efeito, embora José Pedro tenha sido sobretudo um autodidata, recebeu influências de artistas e personalidades do seu tempo com quem privou, como Sousa Lopes e Luís Keil que já mencionei acima, mas também de outros, como Armando Mesquita, Jorge Barradas, Maria Keil, Bernardino Cidade, Álvaro Mendes Alves, Clariano da Costa e Maria de Lourdes Castro.

Um dos seus sonhos foi o de transformar a sua casa de Sacavém – que pôde construir graças a uma modesta herança familiar - num pequeno museu onde pudessem ficar guardadas e expostas algumas das suas criações artísticas, produzidas ao longo dos anos. Na verdade, desde o início da construção que o projeto da sua residência visava concretizar essa ideia de um museu particular, quer destinando para tal uma divisão interior, quer utilizando o jardim. Será então desse modo que irá reunir as suas obras, constituindo assim aquilo a que chamou Museu Particular de Arte e Floricultura (outra atividade por que se interessava), e que se podia visitar por marcação…

Alguns anos após a sua morte, a Câmara Municipal de Loures adquiriu, em 2000, o imóvel, com o intuito de dar verdadeira concretização ao sonho de José Pedro, o que aconteceu finalmente em 2005, ano em que a Casa-Museu abriu ao público, em estreita relação com o Museu de Cerâmica de Sacavém. Desde então, aquele núcleo museológico procura perpetuar, salvaguardar e simultaneamente homenagear a memória deste artista, e também operário da Fábrica de Loiça de Sacavém.

Visitar este local é conhecer o fantástico mundo imaginário de José Pedro. A coleção ali exposta é muito variada; destaco, por exemplo, o Palácio das Formigas ou a Aldeia dos Cogumelos, obras ilustrativas de um dos princípios de José Pedro, que consistia em defender um equilíbrio harmonioso entre o homem, a arte e a natureza. Igualmente notável é a miniatura da catedral de Colónia. A coleção é de facto rica e variada, e aguarda a visita do leitor desta crónica.

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