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Opinião
Alexandra Bordalo – Advogada
Alexandra Bordalo
Advogada

Das Notícias e do Direito

Do bom senso como dever legal...

6 de fevereiro de 2022
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Ou pequenos nadas que dão um monte de chatices...

Não sonham os leitores do Noticias com o elevadíssimo número de conflitos causado por falta de bom senso.

Bom senso não é dar a razão ao outro, ou sentir-se fraco. É ser sensato!

Por exemplo, se o seu empregador lhe quer entregar uma carta em mão e teme que possa ser um despedimento ou termo do contrato, de nada vale recusar o seu recebimento.

E afirmar depois, eu não recebi nada. Só 7 dias depois fui levantar a carta aos Correios e o meu prazo conta desde então.

ERRRADO! O prazo conta desde a data da recusa!

As pérolas que se vão enraizando na cultura popular, provindas da sabedoria da vizinhança e do que se viu na televisão… trazem, em regra, desgostos vários.

Ouvir num qualquer programa de televisão informação sobre, nomeadamente, prescrição de dívidas e a partir daí, com o entendimento e interpretação percepcionados, introduzir todo um comportamento que chega ao ponto de ignorar uma citação judicial «porque está prescrito», vai correr mal.

E correr mal aqui pode ser sinónimo de penhora e de um crescendo de problemas e dívidas que se avolumam.

Temos também a aprendizagem do direito e das leis em vigor através de filmes e séries. Muitas das quais são estrangeiras e referem-se a outro regime legal e a realidades bem distintas da portuguesa.

Quem assiste a uma série norte-americana convence-se que o modo de ripostar aos problemas do locado (imóvel arrendado) é deixar de pagar! Pois, cá no burgo isso dá direito a despejo, sem apelo nem agravo. O modo de exigir ao Senhorio o cumprimento das suas obrigações é outro, e passa por comunicações expressas e actos judiciais nos termos legalmente previstos.

Temos, também, os latifundiários da propriedade horizontal, aqueles que como são proprietários de uma fracção acham que podem fazer o que querem na sua fracção e adjacências. Ou seja, que podem furar a placa e ligar o vão do telhado à sua habitação, erigir construções nas varandas e terraços, encher de móveis e tralha as partes comuns…enfim, quem nunca teve um vizinho destes?

A vida em sociedade dá algum trabalho e a aprendizagem de limites e fronteiras inultrapassáveis é imperativa.

Existe, porém, o reverso, e que é o acesso do cidadão a tratar dos seus assuntos junto das entidades públicas.

Aqui, o que temos com demasiada frequência, é uma imagem metafórica, nada bonita, da centrifugação do cidadão na máquina burocrática do Estado.

É absolutamente extraordinária a forma como o aparelho administrativo português está montado. Parece que deliberadamente para fazer o pobre cidadão desistir de tratar, exigir, demandar o que quer que seja.

O número de fases, serviços, papéis e carimbos, a que temos de recorrer é do além. Já sem falar de quando antecipamos pagamentos que não devemos, dos quais reclamámos, mas como precisamos de uma certidão, pague agora e espere pela decisão (óbvia, patente e manifesta) para quando calhar!

Colaborando com cidadãos estrangeiros ou portugueses que viveram fora, este mascar continuo da chewing gum da burocracia é particularmente difícil de explicar. Aliás, há muitos anos contactei com várias empresas que recusavam fazer negócios por cá, porque quando corriam mal tinham de aguardar por uma longuíssima provação até terem o assunto tratado em tribunal.

Certo, certo é que temos um grande deficit de bom senso, seja o cidadão comum, seja o governante que estabelece burocracias infindáveis, com voltas e engulhos que apenas parecem justificar a sua própria existência.

Almejemos por sensatez e simplicidade.

Saúde e prudência, e bom senso, já agora!

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