Opinião de José Luís Nunes Martins
Amar é crescer e envelhecer a dois
5 de junho de 2020
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Amar não é admirar uma obra-prima imutável. Sermos humanos é estarmos condenados a mudar a cada dia. Por isso, amar é comprometer-se a fazer um caminho a dois, com tudo o que isso implica em termos de mudanças subtis, imprevisíveis e constantes.
Devemos aceitar o outro tal como é. Sem isso não há amor. No entanto, importa compreender a dinâmica do amor ao longo do tempo, uma vez que não somos seres estáticos e imutáveis.
Todos nós, todos os dias, mudamos um pouco. A atenção a esse quase nada que muda é tão importante quanto a consciência do que se mantém. Quando estamos perto demais, tendemos a considerar que conhecemos bem o outro, quando, tantas vezes, pouco a pouco, ele se foi alterando a um tal ponto que já não é senão parecido com o que estamos convictos que é.
Amar é caminhar em conjunto na vida, estabelecendo um sentido em conjunto e seguindo-o. Ao mesmo tempo que nos vamos encontrando, ajudando e educando um ao outro. Sim, cada um de nós é tão único que uma simples ideia pré-feita é o suficiente para estragar tudo. Importa indicar a quem nos ama o que somos, o que fomos e o que queremos ser. Com paciência, tanta quanta a que precisamos ter para o escutar com toda a atenção quando ele estiver a fazer o mesmo. Amar é aprender com o outro.
Não é justo pedir a alguém que nos ame tal como somos, porque isso cria e alimenta uma aparência ilusória de estabilidade que não corresponde à verdade.
Na vida, a maior parte de nós começa por ser amado de uma forma incondicional pelos nossos pais. Olham-nos, mas na esmagadora maioria das vezes só veem o nosso interior, por isso é que podemos ter 50 anos e os nossos pais continuam a ver o mesmo coração! Mas é um coração que nunca é o mesmo, que cresce, aprende, sofre e ama... mantendo-se inteiro e autêntico, nunca é igual.
Há adultos, menos maduros, que tendem a acreditar que o amor é serem amados tal como foram enquanto filhos. No entanto, amar é o oposto disso. É abnegar-se ao ponto de cuidar do outro como se fossemos pais dele.
Quem quer amar tem de crescer e passar da atitude carente de criança à posição de generosidade adulta a que se dá o nome de amor.
Algo que se deseja recíproco, mas que deixa de existir assim que começa a contabilização do que se dá e do que se recebe.
Talvez o amor seja a maior de todas as aventuras, porque basta um instante para que tudo mude, sem que isso altere a nossa vontade de fazer o outro feliz.
Quem ama é capaz de algo pouco natural: deixar-se para trás, dando prioridade ao outro.