Opinião
O tédio dos animais
2 de fevereiro de 2020
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Como seriam 24 horas de um dia, sete dias por semana e 365 por ano se não pudesse sair de casa? E se, em sua casa, não tivesse televisão, livros, jogos ou telemóveis para se distrair? E se dependesse de alguém para o levar à casa de banho, por vezes bem depois de sentir essa necessidade? E se, para além de tudo isso, vivesse sozinho ou sem outro elemento da sua espécie? Conseguiu criar esta imagem?
Pois esta é a vida da maioria dos animais de estimação.
No seu caso, se não se mexer e não se conseguir entreter, é provável que as suas articulações e o seu cérebro atrofiem. No caso deles, não é muito diferente.
O tédio e a solidão adoecem-nos e trazem problemas de comportamento que costumamos atribuir ao temperamento. Dizemos que o cão que ladra ou rosna e o gato que se atirou a alguém são maus quando, na verdade, muitos dos comportamentos desregulados dos animais são causados por nós.
O cão só está a ser cão e o gato a ser gato, a defenderem-se e a mostrarem desconforto. Há que saber lê-los.
Claro que há casos de animais que têm distrações, passeiam muito, correm, têm jardins, cheiram flores, perdem-se no percurso de borboletas e ainda têm uma série de brinquedos em casa e um ser humano atento e brincalhão, mas a maioria não é assim. A maioria passa a maior parte do tempo sem grande atividade, e a generalidade das pessoas não se apercebe disso.
Devia ser obrigatório fazer um curso para se ter um animal de estimação. Para se poder aprender mais sobre a espécie, sobre as suas necessidades, que não são as nossas. Para aprendermos a conhecer as suas personalidades e sabermos lidar com elas, já que nem sempre aquilo que fazemos é aquilo que eles precisam.
E também eles precisam de ser ensinados a estarem confortáveis em casa e a conviverem com pessoas e outros animais, porque ninguém nasce ensinado. Em paralelo, uma reflexão sobre o tempo, paciência e vontade para os acompanhar é necessária.
Não tem tempo? Não lhe liga muito? Então talvez seja melhor reanalisar os motivos que o levaram a tê-lo. E da próxima vez que se sentir entediado, lembre-se dele.
Joana Leitão
Jurista